domingo, 1 de junho de 2008

VIII - A Floresta Sem Fim

A Cidade de Ouro e Prata ficava numa clareira muito iluminada, no último pedaço de terra antes da Floresta do Sem Fim. A floresta era enorme e demorava-se mais de dois meses para percorrê-la inteira de norte a sul, de leste a oeste, daí o seu nome Floresta do Sem Fim. Poucos se aventuravam a explorar a vastidão, pois era muito fácil se perder e nunca mais achar o rumo de casa. A diferença para os jardins da Cidade de Ouro e Prata é que estes, apesar de imensos, confundiam os viajantes por sua beleza, os aromas e os animais encantadores. Já a Floresta do Sem Fim era um lugar estranho, sua beleza era assustadora e os animais, mais selvagens e traiçoeiros. As árvores falavam uma língua antiga e costumavam mudar de lugar, para que quem entrasse na mata, nunca conseguisse usá-las para marcar o caminho de volta.

O príncipe Rajá estava cansado de tanto andar. Em seu ombro, Hamida parecia dormir profundamente. O menino sentia todo o peso da jibóia de estimação. Ainda havia comida e água na sua sacola, mas ele temia não conseguir atravessar toda a Floresta do Sem Fim. Também se perguntava onde conseguiria encontrar a feiticeira. “Ela deve morar em algum lugar muito escondido e essas árvores e animais com certeza protegem a sua casa de visitas indesejadas”.

Sem forças para continuar e percebendo que a noite estava próxima, Rajá decidiu encontrar um abrigo para esperar o próximo nascer do sol, quando então continuaria a busca pela feiticeira. Encontrou uma clareira próxima de um rio. Deixou Hamida e a sacola próximas de uma pedra e levou seu odre para encher de água. Ao se aproximar da água, porém, ouviu uma advertência:

- Não se tira nada da Floresta do Sem Fim sem dar um presente em troca!

O menino ficou assustado e se afastou do rio, procurando a voz. Olhou em todas as direções e não viu ninguém, só a cobra Hamida parecia ainda dormir profundamente. Acreditando que a voz vinha de dentro da sua cabeça e era fruto do cansaço, Rajá voltou à beira do rio para encher o odre.

- Rapazinho teimoso, essa é a última advertência: não se tira nada da Floresta do Sem Fim sem dar um presente em troca!!

Rajá correu assustado para perto de Hamida e para sua surpresa, seu animal de estimação, que antes parecia tão molenga e preguiçoso estava bem desperto. Ele se aproximou da cobra e já ia esticando a mão para recolocá-la no ombro quando ouviu de novo a voz que, parecia sair de dentro da jibóia!

- Rajá, você não entendeu o que eu disse? Para retirar a água do rio, que vai matar a nossa sede durante o resto da jornada, você precisa dar alguma coisa em troca para os seres mágicos que vivem na floresta!!

O menino mal podia acreditar no que seus ouvidos ouviam e no que seus olhos viam. Hamida, a jibóia que ele criava desde que saiu do ovo, sempre languidamente enrolada em sua cintura ou pendendo do ombro como se fosse uma faixa de tecido da roupa do príncipe, era capaz de falar!

- Hamida, como é que você fala?

- Ora Rajá, como todos os animais! Você nunca ouviu as conversas deles nos bosques da Cidade de Ouro e Prata? Claro que ouviu! Você conversava tanto com todos nós quando era menorzinho, mas à medida que foi crescendo, esqueceu a nossa língua e agora, nem lembra mais que somos capazes de falar. Mais um tempo e quando estiver da idade do seu pai vai duvidar até que pensamos.

- Mas porque você não falou comigo esse tempo todo?

- Eu falei sim, você que não entendeu nada. Acho que a floresta tem algum poder capaz de despertar em você o conhecimento adormecido da língua dos bichos, que você sabia falar por instinto quando era menorzinho.

Rajá decidiu que naquele momento, não valia a pena questionar Hamida sobre como ele aprendeu uma língua dos bichos que nem lembrava que sabia falar. O menino, apesar de tão novo e curioso para descobrir aventuras, tinha senso prático. O importante era encher o odre, encontrar um canto seguro para dormir, recuperar as forças comendo dois pães de mel roubados de uma das cozinhas do palácio dourado e pensar no próximo passo para localizar a famosa feiticeira.

Em troca pela água do rio, Rajá deixou uma das pedrinhas azuis do seu turbante. Depois, enrolou-se em uma manta e deitou no chão duro, sob as estrelas. Enquanto dormia, os olhos vigilantes da jibóia velavam seu sono.

(Para conhecer mais sobre a história do príncipe Rajá, acesse os posts dos dias, 18, 19, 20, 23 e 26 de abril; além daqueles de 01, 03, 18 e 21 de maio).

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